Tempos da Escola
Aquela escola velha , outra mãe
em que eu bebi o leite do Saber,
Inspira-me saudades, só de a ver,
desse tempo que foi e já não vem.
Tempos felizes esses, em que eu ia,
a mala negra ao ombro, o rir na face,
pra que na minha mente se amostrasse,
em vez de escura noite, claro dia.
Tempos que se perderam no passado,
como as águas do rio no mar salgado,
esses são, em que eu lia João de Deus
e em que a palavra “amor”, a vez primeira
desta vida cruel e traiçoeira
disseram, soletrando, os lábios meus!
Aquela escola velha , outra mãe
em que eu bebi o leite do Saber,
Inspira-me saudades, só de a ver,
desse tempo que foi e já não vem.
Tempos felizes esses, em que eu ia,
a mala negra ao ombro, o rir na face,
pra que na minha mente se amostrasse,
em vez de escura noite, claro dia.
Tempos que se perderam no passado,
como as águas do rio no mar salgado,
esses são, em que eu lia João de Deus
e em que a palavra “amor”, a vez primeira
desta vida cruel e traiçoeira
disseram, soletrando, os lábios meus!
Vila Nogueira, 22/XI/1941
Sebastião da Gama (inédito)
A escola. Primeiro grupo social com o qual o jovem Sebastião é confrontado, representa uma mãe que lhe irá saciar a fome do Saber. Alegria e saudade sentidas apenas com dezassete anos de idade, mas com uma maturidade induzida pelo sofrimento de conhecer, desde os catorze, os condicionamentos impostos por uma doença para a qual não se conhece a cura. A um ano do ingresso na Faculdade de Letras de Lisboa, já recorda com saudade a criança e a alegria que a vida de então lhe proporcionou. Escola-família, unidade em que cresce, representa a importância da família como integração da educação escolar.
Na escola as crianças sentem-se tanto mais felizes e capazes de absorver conhecimentos, quanto maior for a capacidade do professor para observar a família. Mas quando aquele considera, para além da família, a cidade e a nação, maior é a segurança que as crianças sentem na escola. Porque o professor é um elo desta cadeia, tem que educar o homem através da capacidade de integração de todos os grupos socio-humanos representados na sociedade. O “claro dia” a que Sebastião alude é fruto da capacidade do professor para transferir a superioridade da sua orientação espiritual para as consciências dos alunos, estando desta forma, a interagir com o mundo. Nesta perspectiva, qualquer que seja a profissão futura, é imprescindível assegurar aos jovens o máximo de valores humanos. Esta certeza foi fulcral em Sebastião da Gama, homem e professor. Foi em torno desta verdade que os seus discípulos aprenderam a Vida. “O segredo é amar...” consagrou-lhe o lugar que ocupa em todos aqueles que foram bafejados pela sorte de com ele terem privado.
Sebastião integrou em todos os seus actos um triângulo em cujos vértices figuraram a Honestidade, a Independência, o Respeito à Arte e à Vida. Desta maneira foi homem, artista, pedagogo, ecologista (ainda antes de se falar na ecologia!). Soube, como ninguém, ouvir o outro, quem quer que ele fosse. Deu-se aos outros. Esta dádiva, base humanizadora, é a ferramenta com a qual o homem de amanhã se integra harmoniosamente na sua sociedade. Será fonte de crer em um mundo melhor onde o outro é tratado com a maior humanidade e respeito. O aluno de hoje tem que acreditar no homem de amanhã. A crença positiva no futuro é, segundo Daniel Sampaio, essencial a todas as gerações.
A cultura humana que se exige ao professor, decorrendo necessariamente da sua boa preparação, é, pois, o caminho. “Para ser professor, também é preciso ter as mãos purificadas. A toda a hora temos que tocar em flores”. “O que eu quero, principalmente, é que vivam felizes”. Frases do seu Diário.
Todas as reflexões que fiz conduzem-nos a crer que a experiência escolar se deve basear na convicção de que esta é um espaço de formação humana amplo e não apenas uma cadeia de transmissão de conteúdos destituídos de interesse.
Somos responsáveis pela sociedade em que vivemos e as nossas atitudes ajudam a construir um mundo melhor ou pior. Nesta medida a escola não pode alienar os alunos. A libertação autêntica, que é a humanização em processo, não é algo que se deposite nos homens. Não é uma palavra a mais, oca, mitificante. É praxis que implica a acção e a reflexão dos homens sobre o mundo no sentido de o transformar.
Maria da Glória Dias
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